domingo, 30 de outubro de 2011

Não me ponham rótulos!

     Este título está há tempos me aguardando em "editar postagens".  Estava esperando para que todas as idéias estivessem congruentes.  Desisti.  Sou mesmo uma incongruência ambulante.
     Enquanto aguardo o final dos jogos pan-americanos para colocar a tabela final - pelo que soube Cuba nos passou, estamos em 3º lugar - vou maquinando meus pensamentos.  Enquanto dirijo, faço atividades rotineiras, faço pilates, escuto música, leio, meus pensamentos montam textos inteiros; discuto com noticiários televisivos e radiofônicos, com notícias de jornais, manchetes de revistas, artigos desta ou daquela revista, escrito por tal e qual pessoa.  Mas não é este o ponto, já estou tergiversando...
     "Ai como sua filha é magrinha, ela não come? tão miudinha...", ouvi a vida inteira na infância, por ser magra demais, quase esquelética! e os apelidos dos meus irmãos: lingüiça (naquele tempo era com trema...), saracura... alta e com pernas finas... Minha mãe comentava que as pessoas de pernas finas eram mais trabalhadeiras do que as de canelas grossas; coisas de antanho.  Creio ser uma verdade, pelo menos pelo que me toca.
     Pelos cabelos crespos, na escola, me chamavam de bombril, esta já contei.  Se não gostava do que falei no parágrafo anterior, muito menos deste; cabelo a gente não escolhe, é que nem família; mas da minha eu gosto, não trocaria por nenhuma outra. 
     Nasci e fui educada em uma família evangélica, protestante, os Metodistas. Para quem desconhece, o Metodismo nasceu na Inglaterra, uma das religiões protestantes derivadas da Igreja Católica.  Por ser evangélica, grudado na testa crente. Ora, nada mais de demonstração de ignorância do que chamar os evangélicos de crente; quem são os crentes?  Em princípio, os que crêem em alguma coisa, logo, se os católicos também crêem em Deus, também são crentes; mas pronunciam num tom pejorativo, como se minha religião fosse menor do que as outras, ou menos verdadeira. Ou todas possuem a mesma verdade, ou nenhuma o é, pois as religiões foram criadas pelos homens; o que foi criado por Jesus, no caso o cristianismo, foi o próprio cristianismo.
     Quando estudava na escola de elite de minha cidade, com bolsa de estudos, pobre. "Ah, não pode ir à excursão pois é pobre; não pode fazer vestido longo para formatura pois é pobre; olha o sapato que a criatura comprou, credo!  e a calça, então...ah, tu não vais debutar? eu vou...(naquele tempo havia o baile de debutantes na cidade, o maior acontecimento social do ano);  não pode isto, não pode aquilo..." Este é um dos que dói muito, muito mesmo, por quem passa por tais humilhações feitas por colegas melhor colocados no mundo e sem um pingo de educação e respeito pelos outros. Mostra o que é valorizado, o que é importante para aqueles que consideram que "têm berço". Mas berço todos nós temos, ninguém nasce e vai dormir no chão!
     Quando morava num bairro de minha cidade, suburbana.  Só era bom quem morava no centro, coisas piegas de pessoas com pensamentos pequenos.  Eu morava no bairro, sim; mas era um lugar lindo, com a horta que meu pai plantava; as uvas que ele cuidava com muito carinho, e que cada cacho pesava, com certeza, mais de 1kg - tinha da preta e da branca.  Minha mãe criava galinhas, comíamos ovo quente todo dia antes do café da manhã, gemada, e a mãe fazia pães, cucas e bolos maravilhosos. Na escola estadual em que estudei, me destaquei sempre em primeiro lugar na classificação da turma - naquele tempo não era pecado, ainda, dar menções honrosas e classificar os alunos pelo aproveitamento escolar; ao contrário, era um estímulo para estudar cada vez mais.  E quando fui para a escola de elite, estava sempre entre o 1º e o 4º lugar, entre 30 a 40 alunos; só tinha 2 meninos com os quais eu brigava na classificação, e nenhuma outra menina me alcançava, muito menos as que só viviam pensando  nos vestidos de festa e bailes de gala.  Só peguei 1 exame na primeira série, como disse, desenho...nas demais, passei sempre por média, o que não era fácil.
     Quando cheguei à faculdade, e como não concordava com tudo que queriam me enfiar goela abaixo, era pequena burguesa, de direita, reacionária...nem eu sabia o que era isto.  Vamos lá: pequena burguesa me incomodava muito, por meus colegas petistas, já naquela época de 73 em diante, que se consideravam comunistas ou de esquerda, acharem que eu era do lado da ditadura.  Não era; nunca tive ligação nenhuma com ninguém da polícia ou dos militares ou com qualquer partido político, nem de direita, nem de esquerda nem de centro.  Mas eles demonstravam ignorância: na origem, conta-nos a História, e também o "Aurélio", burguês era quem morava nos burgos europeus, na idade média; e burgos eram pequenas cidades e aldeias; então, como eu morava em uma cidade pequena, e meus colegas também, também eles eram burgueses...mas sabemos que não é este o significado dado.  O burguês que falam em tom de deboche é o que teve ascensão social e tinha dinheiro; agora, pequeno burguês, como ofensa...eu trabalhava para me sustentar, como muitos deles; meu pai sempre trabalhou também; meus irmãos...minha mãe sempre cuidou da casa e de nós, aliás sempre com muito amor e carinho, qualidade e firmeza...esta uma questão que somente os "de esquerda" podem explicar. Aliás, ignorância não se explica. 
     "De direita" talvez por eu não concordar com tudo que queriam me impingir.  Como o que acontecia no tempo da ditadura, como já mencionei em outro post, era mais nos grandes centros e no "ABCD" paulista, que faziam as bagunças devidas e protestos políticos, assim como no Rio de Janeiro, Minas, Porto Alegre, nós, que éramos pessoas simples, querendo viver, trabalhar, ter uma vida  normal éramos obrigados a ser revolucionários com os que achavam que estavam certos?  Ninguém deve fazer nada obrigado, já garante a Constituição.  Por isto, também, o "reacionária"...ora vamos!  O que eu queria naquele momento era trabalhar - emprego não me faltava; com as qualificações que tinha, à época, podia escolher emprego; o tal milagre econômico, apesar de tudo o que soubemos depois, que foi feito de errado, não foi uma mentira.  Eram coisas concretas; quem não tinha casa, nem dinheiro,  financiava, pagava em 20 anos e tinha a escritura na mão.  Por não concordar em ser "esquerdista", nunca fui indicada para uma bolsa de estudos na faculdade particular, muito menos para intercâmbio com faculdades e cursos no exterior; para isto, não era preciso nem ser bom aluno, bastava estar no lado certo politicamente.  E isto, não era só naquele tempo, não; continua do mesmo jeito...
     Por gostar de alimentos e vida o mais natural possível, natureba; por não beber até cair, puritana; por achar que casamento ainda era uma coisa válida, na época em que eclodia o amor-livre, antiquada, careta, quadrada, e outros rótulos mais; por achar que devia cuidar da minha coluna, e manter uma postura correta, "pose de rainha"; por ter conseguido aprender um pouco de etiqueta e saber portar-me nas mais diversas situações, metida; e assim vai, mas...
     Não me ponham rótulos! Sou apenas um ser humano, demasiado humano, como dizia Nietzsche; e com todas as idiossincrasias que qualquer ser humano pode ter.


                                       
(Imagem: http://www.medinforme.com/wp-content/uploads/2009/12/duvida-300x234.jpg)




     Ah, e já ia esquecendo: quando fazia greves, paredista de esquerda, se  o governador fosse de direita; e paredista de direita, se  o governador fosse de esquerda - vá entender!

     Quando me formei e passei a lecionar, elitista, topo de pirâmide, pois somente 1% da população consegue concluir um curso superior no Brasil; quando consegui comprar um carrinho, a prestação, rica e poderosa - vê se pode! Se a gente se incomodar com todos os rótulos, fica louca; melhor  é dar uma de ignorante - ignorar.