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Imagem do exemplar que tenho às mãos. |
Há quase dois anos o havia adquirido em nossa feira do livro, pois a outra vez o li da biblioteca da escola onde lecionava.
Pablo Neruda não é Pablo Neruda, este é seu pseudônimo. Ricardo Neftalí Reyes Basoalto, natural da cidade chilena de Parral nasceu no início do século XX, em 12 de julho de 1904. Filho de professora e de ferroviário, cresceu na cidade de Temuco, perto de florestas, em meio à natureza, de acordo com informações da breve biografia do volume que tenho às mãos.
Desde a adolescência começou a escrever e publicar textos; estudou francês e pedagogia; foi diplomata, vivendo em diversos países. Publicou várias obras, sendo aclamado pelo público chileno e mundial.
Foi filiado ao partido comunista chileno, sendo eleito senador; exilou-se devido às diversas complicações políticas pelas quais passou o Chile. Voltou ao Chile em 1952; prêmio Nobel de Literatura em 1971, faleceu em 1973 em Santiago do Chile.
A Barcarola
Já havia amado o livro a outra vez que o li, tendo recordado este prazer, agora renovado.
Nele, Neruda proclama ao mundo o seu amor à pátria, aos heróis, à cultura, às florestas, às montanhas, ao povo, à alimentação chilena, às espécies de vegetação nativa, enfim, seu amor ao Chile.
É como se ele pegasse um barco e fosse passando por diversas épocas, acontecimentos, povos, figuras públicas ou não. Amor ao seu próprio país, ainda não vi tão grande em outro autor.
Quanto à linguagem, apresenta-se culta, com muitos vocábulos típicos da terra, estes com notas ao pé da página para melhor compreensão. Linguagem poética elevada, figuras de linguagem expressivas. Não à toa um prêmio Nobel de Literatura.
Os poemas são ordenados em forma de episódios.
De destacar alguns poemas que gostei por demais, e que divido com as pessoas que, como eu, amam poesia. Quem não gostar, não me leia.
"Segundo episódio:
Estou longe
É minha a hora infinita da Patagônia,
galopo estendido no tempo como se navegasse,
atravesso os tenros rebanhos trocando de passo
para não ferir as nuvens de espessa roupagem,
a estepe é celeste e cheira o espaço a sino,
à neve e a sol macerados no pasto pobre:
gosto da terra sem habitações, o peso do vento
que busca meu peito curvando a ramagem de minha alma.
(...)
E busco no rumo sem rumo da oceania terrestre
seguindo as pegadas apagadas das ferraduras,
enquanto sai a lua como o pão da boca de um forno
e se vai pelo campo amarrada ao cavalo mais lento do céu. (...)
Troquei tantas vezes de sol e de arte poética
que ainda estava servindo de exemplo em cadernos de melancolia
quando já me inscreveram nos novos catálogos dos otimistas
e apenas tinham-me declarado escuro como boca de lobo ou de cão
denunciaram à polícia a simplicidade do meu canto
e mais de um encontrou profissão e saiu a combater meu destino
em chileno, em francês, em inglês, em veneno, em calúnia, em sussurro.
Aqui levo a luz e a estendo para o meu companheiro.
A luz brusca do sol na água multiplica pombas, e canto.
Será tarde, o navio entrará nas trevas, e canto.
Abrirá sua adaga a noite e eu durmo coberto de estrelas. E canto.
Chegará a manhã com sua rosa redonda na boca. E eu canto.
Eu canto. Eu canto. Eu canto. Eu canto."
Terceiro episódio.
Primavera no Chile
(...) Setembro adianta seus olhos mapuches matando o inverno
e volta o chileno à ressurreição da carne e do vinho.
Amável é o Sábado e apenas se abriram as mãos da Sexta-Feira
voou transportando ameixas e caldo de lua e peixe." (...)
Quinto episódio.
Os sinos da Rússia
ANDANDO, movendo os pés sobre um amplo silêncio de neve
escuta-me agora, amor meu, um sucesso sem rumo:
estava deserta a estepe e o frio exibia suas duras alfaias,
a pele do planeta brilhava cobrindo as costas nuas da Rússia
e eu no crepúsculo imenso entre os esqueletos das bétulas,
andando, sentindo o espaço, pesando o pulsar das solidões. (...)
e é assim como eu, caminhante, escutei os sinos da Rússia
desatarem entre o céu e a sombra o profundo estupor de seu canto. (...)
Eu sou, companheira, o errante poeta que canta a festa do mundo,
o pão na mesa, a escola florida, a honra do mel, o som do vento silvestre, (...)
Sinos de ontem e amanhã, profundas corolas do sonho do homem,
sinos da tempestade e do fogo, sinos do ódio e da guerra,
sinos do trigo e das reuniões rurais à beira do rio,
sinos nupciais, sinos de paz na terra,
choremos sinos, bailemos sinos
cantemos sinos pela eternidade do amor, pelo sol e a lua e o mar e a terra e o homem."
Maravilhosa esta navegação na Barcarola de Pablo Neruda.
Neruda, Pablo. A barcarola; trad.de Olga Savary.-Porto Alegre:L&PM, 2016.
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