sábado, 24 de junho de 2023

Vazio

 

 

 

                                        
FOTO DA AUTORA. PROIBIDA A REPRODUÇÃO/CÓPIA SEM AUTORIZAÇÃO EXPRESSA.

 

 

 

 

 

Os meus braços estão vazios

Já não estás mais aqui a preenchê-los.

A indesejada das gentes te levou, irremediavelmente!

Sem recursos, sem apelação!

A vida está vazia

Do teu amor

Do teu sorriso

Do teu carinho

 

Meu peito está vazio

Do teu calor

Do frêmito do teu coração

Das carícias das tuas mãos

 

Minhas mãos permanecem vazias

De te percorrer

De te sentir

De te acariciar

 

Minha boca está vazia

Dos teus beijos

Das palavras de amor e carinho

 

Meus ouvidos estão vazios

Dos teus sussurros nas noites de luar

E nas sem luar também...

 

Meus olhos estão vazios de ti

Do teu olhar intenso

Que não precisava de palavras

 

Meu corpo está vazio de ti

Minha vida está vazia!

 

 

 

 

Joinville, 5/3/23.

Tangentes e paralelas

 

 

 

 

 

 


Está em seu mundo

Está em outro mundo

Um desígnio surgiu?

Duas tangentes tocaram-se levemente

Ao sabor da aragem

Do perfume agreste

Do vulcão em erupção

Das afinidades

Do olhar matreiro

Da música

Dos sabores...

Amores?

Mas as tangentes são malandras

Confundem...

Impossibilidades...

E vão transformando-se

Em duas paralelas

Aquelas...

Que não se tocarão jamais!




Porto Alegre, 13/4/23.

 

INVERNO

 

Praça Getúlio Vargas - imagem da autora.


 

As folhas avermelhadas já caíram, todas.

Estão nus os galhos das árvores, esticados, eretos rumo ao céu,

Como a lamentar a ausência do sol.

O resto de calor que ainda resistia, foi sendo empurrado pelo vento minuano... para onde?

Chegaram os dias nublados.

As nuvens lastimam a entrada do frio, derramando-se sobre as cidades.

A neblina manifesta-se de manhãzinha, tirando de nós, humanos, a visão da aurora bela.

Acendem-se as lareiras, os fogões à lenha, os aquecedores, os aparelhos de ar condicionado.

Acendem-se os corações, com a proximidade,

O aconchego e a busca de calor para aquecer os corpos enregelados.

Saltam, sorridentes, do fundo das gavetas,

Toucas coloridas, luvas, cachecóis, botas, meiões, cobertores, edredons, mantas.

O quentão e o vinho,

O café e o chá,  quentinhos,  ajudam a enviar o frio para fora de nossos lares.

A sopa asperge seu aroma delicioso por todo o ambiente,

Antevendo o prazer do alimento que,

Além de nutrir, aquece os corpos e as almas.

Nos dias de ventania, chuva renitente, trovões e temporais,

O lar é a nossa caverna, o nosso refúgio,

Onde nos sentimos seguros,

Onde guardamos nossos amores, protegendo-os.

Onde vivemos nosso tempo de recolhimento, de meditação,

De busca do eu-interior.

O  inverno é introspectivo.

Viramos eremitas.

 

 

Lorení

Palmeira das Missões, 21/6/23.

sexta-feira, 9 de junho de 2023

PRAZER SEM LIMITES: LEITURAS QUE DELEITAM.

 


 

 




Há algum tempo não escrevo.  Muitos acontecimentos vão me levando de roldão, e tenho preferido vivenciar a escrever.  Estou confiando na minha memória.

Mas, hoje, feriado de Corpus Christi, além de outras atividades, da caminhada matinal, da oitiva de muita música, puxo alguns dos livros que li nos últimos tempos, e vou comentá-los para ti, meu leitor que, como eu, ama ler.


1.      1. Amor para corajosos, de Luiz Felipe Pondé.

Amor, amor, amor... tema de todos os poetas, escritores, jovens, maduros, idosos, homens, mulheres, estudiosos, filósofos... tema universal, e, antes de um tema, um grande sentimento. O maior sentimento de todos.

O amor entre homem e mulher é um sentimento arrebatador!  Fogueira que incendeia, faz tremer, arrepia, instiga o desejo, a vontade de estar perto do ser amado, com ele enleado, acarinhado, volúpia que arrebata e sugestiona loucuras, já dizia Rita Lee.

O assunto entrou em minha vida na adolescência, ao ler os versos de Luís Vaz de Camões, em Rimas, 1598; que também me fez apaixonar-me pela Poesia:

 

“Amor é fogo que arde sem se ver,
é ferida que dói, e não se sente;
é um contentamento descontente,
é dor que desatina sem doer.

É um não querer mais que bem querer;
é um andar solitário entre a gente;
é nunca contentar-se de contente;
é um cuidar que ganha em se perder.

É querer estar preso por vontade;
é servir a quem vence, o vencedor;
é ter com quem nos mata, lealdade.

Mas como causar pode seu favor
nos corações humanos amizade,
se tão contrário a si é o mesmo Amor”

 

Com este tema o filósofo Luiz Felipe Pondé lançou o livro “Amor para corajosos, reflexões proibidas para menores.”

Sempre curiosa sobre o tema, que sempre fez parte da minha vida, comprei o livro para ver o ponto de vista filosófico do assunto, num momento da minha vida em que estou saindo de um profundo mergulho em uma situação de luto, e tentando sobreviver, redescobrindo a mim mesma em um outro mergulho: no meu eu-profundo, meu eu-poético através da lírica poética e redescobrimento de sentimentos que estiveram escondidos sob as cinzas da sobrevivência, partindo para novas situações de encontro comigo mesma e com o outro.

Já na primeira orelha, o autor coloca algumas epígrafes que chamam a atenção e induzem à curiosidade, e à leitura do livro:

“O amor não é para iniciantes.”

“Um dos maiores medos contemporâneos é o medo do afeto.”

“Quem nunca se perdeu no amor é falso de alguma forma”

“A intimidade sexual é uma das rotinas mais poderosas para a manutenção do amor”

“Pode existir safe sex.  Mas não existe safe love.”

“Amar será sempre uma forma de agonia.”

“Eis uma das maiores tragédias do amor: ele não é garantia de uma vida feliz nem tampouco amorosa.”

“O amor só se conhece pelos frutos”. Sören Kierkegaard.

“Amor, se bem pensado, é doença do pensar entre duas pessoas ligadas, sinceras e de sexo diferente, que nos acomete como anseio, nascido da visão perturbada, por abraçar, beijar e pelo fruir carnal.  Amante nada mais é do que aquele que arde e em tal se deleita.  Frutos não busca alcançar, e em deleitar-se em nada se esforça”. (André Capelão, Tratado do amor cortês, SP:Martins Fonts, 2000, p.5 e 6.)

 

Na introdução, Pondé já menciona o medo do amor, referindo-se a uma pesquisa recente que conclui que a solidão cresce, principalmente entre os jovens.  O medo é a marca da nossa civilização. “Um mundo limpo e estéril, mas feito de covardes do afeto”. Mencionando desde o início que o conceito de amor como conhecemos data da Idade Média, e os medievais já diziam que o amor era a “doença da alma”.

Inicia o primeiro capítulo com a interrogação: “Por que o amor romântico exige coragem de quem ama?” O amor desordena o afeto entendido como desejo por alguém, ou alguém fica ‘louco’ por alguém.  Coragem pois há o medo da rejeição...

No capítulo 4 disseca que o berço do atual entendimento do que seja amor teria sido o Romantismo.

No capítulo 11 menciona “As virtudes do amor: a personalidade encantadora”.  Excertos:

“A beleza escraviza o olhar masculino. (...)  A alma da mulher amada é parte dessa beleza.  Sob o olhar masculino, a inteligência numa mulher amada é parte de sua personalidade sedutora.  O modo como ela se revela inteligente tem a força de uma saia justa com salto alto.  A inteligência cheira a batom vermelho na boca de uma mulher amada”.(...)  Perder-se no amor por alguém é encontrar-se como ser humano que para existir precisa de um outro a quem reconheça como o ser humano mais importante no mundo para si.  Afinal, alguém em quem confiar.” (...) p.77/78.

“O encanto moral do amor nasce justamente desse encontro entre coragem, leveza, desespero e desejo.” P.79.

“(...) o amor sem confiança não existe.” P.81

“(...) o amor não pede licença para entrar.”

“Narcisistas, mimados e ressentidos não são capazes de amar”.

“A ideia de Platão é que o amor (Eros) gera beleza, forma, vitalidade.  A experiência do amor, além de sofrimento e dilaceramento, seguramente gera um desejo pelo mundo enquanto realidade a ser fecundada por aqueles que amam.  Por isso, é comum se dizer que o amor é da ordem da saúde psíquica na medida em que predispõe a pessoa a investir na vida.  O amor costuma dar fé e confiança e, quando correspondido, gera uma profunda sensação de força e generosidade. P.106

“(...)  Mas um dos efeitos mais regeneradores do amor é a capacidade dele de restituir o amor-próprio e a autoconfiança.” p. 107

“(...) só gente mais madura, com mais estofo psicológico, é capaz de amar porque o amor exige confiança no outro, autoconfiança, generosidade, coragem, enfim, virtudes normalmente associadas a pessoas mais maduras e seguras.” p.111

“O que é necessário para que o amor sobreviva?

(...) Essas condições são segurança, generosidade material, investimento concreto um na vida do outro, desejo sexual ativo na mulher, potência sexual masculina.  Amor é concreto como pedra. (...)” p.119

“A intimidade sexual é uma das rotinas mais poderosas para a manutenção do amor. Não existe amor platônico, a não ser em pessoas doentes de alguma forma, pois o amor pede carne.  É carnívoro como um predador pré-histórico.  (...) Pede toque.  Uma mulher amada morre quando é tratada como santa.  Seu ambiente natural são o pecado e a posse.  A separação entre amor e sexo é para ignorantes.”p.120/121

“Só se é livre quando se ama.” Santo Agostinho.p.173

“O amor entra pela fresta da porta.  Nunca é convidado, mas toma o ambiente quando é notado.  Encanta pela sua força vital.  Pelo desejo de mais vida que traz consigo.  Por isso as pessoas quando amam sentem que estão à beira de encontrar a melhor versão delas mesmas.” P.178

“ O amor é aquele que permite a você demonstrar para a pessoa que você ama suas maiores fraquezas sem medo de que ela as use contra você.”. p.180.

“Por isso, contra o que a maioria imagina, quanto maior o nível de maturidade de uma pessoa, maior o efeito dessa paixão sobre ela, porque só se é capaz  de reconhecer esse pequeno pedaço de paz quando já se atravessou muitas guerras.  O amor não é para iniciantes.” P.188.

 

Vale a leitura!

 

PONDÉ, Luiz Felipe.  Amor para corajosos. – São Paulo: Planeta do Brasil, 2017, 192p.




2.       Contos completos, de Sergio Faraco.

O autor é gaúcho do Alegrete, nascido na década de 40 do século XX sendo, então, nosso contemporâneo.

Seus contos dissecam a vida dos gaúchos que vivem na fronteira, na região central do Estado, em Porto Alegre, em todo lugar.  Em seus contos não há o gaúcho mitológico.  Há a descrição de histórias de um povo que luta todos os dias pela sobrevivência, trabalha, luta, sofre, tem pequenas alegrias e grandes problemas a serem solucionados. Desemprego, velhice, sexo, juventude, formas de vida, síntese humana.  Em três partes, Faraco relata a fronteira, em outros tempos; a infância, a solidão; e, por último, o cidadão da cidade grande.

As descrições de locais do Estado do Rio Grande do Sul são fieis, assim como o relato dos acontecimentos nas vidas das personagens.

Vocabulário acessível, um estilo enxuto de escrita, extremamente competente, prende o leitor desde a primeira linha.

Excerto:

Conto: “ Neste entardecer

“(...) Rapadurinhas, queijo, suco de maracujá, em breve sairias a campo para as pequeninas crueldades matinais.  Aqui era a empalação do caracol num pau de fósforo.  Ali confundias as pobres formiguinhas com o dedo atravessado no carreiro.  De vez em quando um marandová te queimava o lombo e era uma correria dentro de casa com talcos e pomadas.  Não, tu não tinhas passado nem futuro.  Para ti, Vovó Rosário tinha nascido de cabelos brancos e com dores reumáticas, Major Verardo era apenas um busto negro cuja vida e cuja obra não tinham sido deste mundo.  A morte, para ti, não passava de uma moléstia das gentes pobres, que não se vacinavam no posto de saúde, e mesmo assim era uma ausência temporária. (...)”

Muito interessante!

 

FARACO, Sergio. Contos completos.- 3ª ed.- Porto Alegre:  L&PM, 2018, 352p.


1.      

sábado, 3 de junho de 2023

HUMANA NATUREZA

 

                                                                  Rio Uruguai, 2020.

(Foto da autora, proibida a reprodução sem autorização.)

 


Cerro as pálpebras.

O motor do barco ronrona suavemente.

A aragem toca levemente minha face.

Num instante, compreendi meu pai que amava ir pescar.

Tinha sua canoa rústica, movida a remos.

Só levava meus irmãos.

Privou-me desse prazer,

Sentido agora,

De flutuar sobre as águas,

Aspirar o cheiro do rio,

Escutar o ruído das ondas

Formadas pelo deslizar do barco.

O ar fresquinho envolve meu ser neste verão.

O sol abana, lá ao longe, num vermelho majestoso,

Recolhendo-se,

Após mais um dia de brilho soberbo, imponente,

Entranhando-se no rio,

Indo dormir com os peixes.

A paisagem acalma-me,

Evoco meu ser primitivo,

União de corpo e natureza.

Um bem-estar toma-me por inteiro.

Paz,

Rio Uruguai,

Humana natureza.



(Fevereiro/2020.)