Como não sou uma pessoa importante, uma celebridade como se diz hoje, que os jornalistas ou escritores vão querer fazer minha biografia ou escrever minhas memórias, vou relatando, eu mesma, coisas que me recordo e que tiveram alguma importância para mim. Se alguém lê meu blog, é por que gosta dos meus escritos.
Meus pais moravam na cidade de Santo Ângelo e minha mãe veio, com meu irmão mais velho, visitar os pais antes do meu nascimento, e eu me apressei, nascendo em outra cidade que não a da residência deles. O dia era 10 de fevereiro, aniversário de meu avô, Bento. Ele ficou muito feliz, conta minha mãe, e todos os anos, enquanto ele viveu, comemoramos juntos o aniversário, com um churrasco.
Fiquei dez dias sem nome, até que meu pai viesse me conhecer e decidir com a mãe que nome eu teria; o pai queria um, a mãe outro, no fim decidiram pelo segundo nome de minha madrinha. Naquela época, as viagens entre Santo Ângelo e Ijuí demoravam muitas horas, embora distem em torno de 50km; eram feitas de ônibus, em estradas não asfaltadas – estradas de terra ou de chão, onde levantava muita poeira em dias secos, ou os ônibus atolavam se chovesse, devido ao barral; ou de trem Maria Fumaça, e também levava muitas horas para chegar ao destino.
Na casa de meus avós sempre tinha muita gente; minha mãe tinha 7 irmãos, alguns já estavam casados. Minha avó tinha muitas vizinhas, e estas também tinham muitos filhos. Era uma quadra cheia de crianças e jovens de todas as idades; todos se conheciam, eram amigos, brincavam e faziam artes juntos.
Depois de algum tempo, meus pais alugaram uma casa perto da minha avó e ficamos morando ali até mais ou menos meus 7 anos.
Minha avó amava fazer docinhos de leite – que eu adoro comer até hoje -, de abóbora e outros doces, além de “schmier” (um doce pastoso, cujo nome é de origem alemã, mais denso que a geléia, feito com a polpa de frutas) para passar no pão, além de geléias, bolos, cucas, bolachas coloridas e muitas outras delícias que enchiam os olhos dos netos e de outras crianças, e deixava todo mundo com água na boca.
Meu irmão e eu somos os netos mais velhos na família materna. Isto trouxe-nos um encargo muito grande em relação à primaiada mais nova. Alguns primos nem chegaram a conviver conosco pois nasceram muito depois, uma vez que os tios mais novos, com idade próxima da nossa, tiveram os filhos mais tarde.
Mas do que queria falar era da casa da vó. Ela plantou muitas árvores frutíferas nos fundos do lote: tinha laranja, bergamota, pêra, pêssego, figo, limão, entre outras, além de uma horta com todo tipo de verduras e legumes, pois era agricultora na sua juventude, além de professora primária. Num lado tinha mais bergamotas , e na frente tinha a árvore “dos netos”, que era uma laranjeira de umbigo muito alta e que dava muitos frutos; ao seu lado, tinha um pé de romã, que nunca mais vi outro igual, e nunca mais vi romã, depois que o pé morreu. Também tinha muitas flores na frente, margaridas, rosas, cravos, amores-perfeitos, hortência e muitas outras variedades, além de um pé de primavera que, na minha lembrança, evolava perfume o ano inteiro. Toda vez que a gente chegava na casa da vó, ao passar pelo portão, sentia o perfume delicioso da primavera; era embaixo dela, em sua sombra e aspirando seu perfume, que meu avô sentava para tomar chimarrão toda tardinha, e ver o movimento; enquanto moramos perto deles, eu pegava minha cadeirinha, minha cuia e bomba minúsculas e sentava ao seu lado, também para ver o movimento. Era sua companheirinha. Talvez por isto os primos mais novos não entendam o amor que sinto pelo local da casa de meus avós, que era de madeira e não existe mais; creio que nem a primavera foi mantida pelos atuais moradores.
Romã
Creio ser parecida com esta a primavera perfumada.
Imagem: http://www.google.com.br/imgres?imgurl=http://lua.weblog.com.Eu adorava passar na frente e ficar olhando para o jardim da vó, que ela cuidava com muito carinho, preparando a terra, plantando as árvores e flores, tirando os matos e mantendo o terreno limpo e agradável aos olhos e ao olfato.
Era uma casa simples, mas que cheirava a coisas gostosas, ao carinho dos avós, ao amor da família, às árvores perfumadas e às frutas gostosas que comíamos com prazer até ficar satisfeitos. É com saudade que recordo dos meus avós, pessoas muito queridas e importantes na minha vida, que me acompanharam em uma parte da minha infância: meu avô, até eu completar 8 anos, quando ele faleceu, o que me deixou muito triste; minha avó teve vida mais longa, e fomos muito amigas até seus 85 anos, quando, então, ela nos deixou. Antes disso, ela escreveu suas memórias, as quais revisei, e foram publicadas pela Livraria Unijuí Editora: “Memórias da Vó Deza”, nas quais ela relata sua vida e muitos acontecimentos históricos ocorridos na Região desde o começo do século XX.