sexta-feira, 16 de dezembro de 2022

NATAL

 

                               

 

        As primeiras lembranças que tenho do Natal são da casa de meus avós maternos.

        Morávamos em Santo Ângelo e viemos passar o fim de ano com eles. Eu  devia ter uns quatro anos, alguns de meus tios ainda eram solteiros.  A mais nova ainda era criança, pois é seis anos mais velha que eu.  Ela tinha uma boneca que andava, virando a cabeça, e dizia: mamãe.  Era a Marta. Ela não me deixava brincar com a Marta...

        Minha madrinha deu-me de presente uma bonequinha de louça, linda, de olhos azuis e cabelos castanhos. Na caixa estava escrito “Tiquinha”, pois era pequenina, assim como eu.  Embora não caminhasse, ela chorava quando a gente mexia nela.  Mas, quem tem irmãos e não irmãs, sofre! Um dia que brigaram comigo, meus irmãos atiraram a Tiquinha dentro de uma bacia cheia d’água, e ela parou de chorar e parou de movimentar os olhos; quem chorou fui eu!  Estragaram minha boneca! Tive que levá-la ao hospital de bonecas. Eles fixaram os olhos dela para sempre! Mesmo sem chorar mais, tenho-a até hoje!

        Como fazíamos parte do povo que dependia das brizoletas para fazer o Natal, meus irmãos ganharam caminhões de madeira feitos por meu pai.

        Era tradição na minha família, e fui aprendendo com o passar do tempo, na Noite de 25 de dezembro ir ao Culto de Natal na Igreja Metodista.  Eu ficava emocionada ao ouvir os membros da igreja cantarem, bem alto, com harmonia a música Noite Feliz  e muitas outras. Todas as mulheres dos pastores tocavam órgão, então ficava uma cerimônia linda.  Sempre tinha, também, a representação de Natal, sendo que os jovens e as crianças desempenhavam o papel de José, Maria, os reis magos, pastorzinho, etc. Jesus era um boneco grande, mas uma vez puseram um bebezinho na manjedoura. E tinha a música dos duendezinhos... eu fui duende, Maria, narradora, etc...

        Quando eu tinha 8 anos, e já morávamos em Ijuí, ganhei um bebezão.  Ô felicidade! Gostei tanto dele, cuidei tanto para não estragar, que minha primeira filha chegou a brincar com ele.

        O tempo foi passando.  Fui ganhando vários presentes de Natal, desde brinquedos de todos os tipos para brincar de casinha, como era a tradição.

        Quando estávamos na escola, meus pais sempre davam para nós, além dos brinquedos, um livro para quem passasse de ano.  Lembro de alguns que ganhei: O macaco trapaceiro; O califa cegonha; livros das princesas Cinderela, Branca de Neve...; Histórias que ficaram na História, entre outros.  Minha família é de leitores.  Meus pais liam muito, minha avó materna também, e muitos descendentes são leitores e alguns gostam, também, de escrever, assim como eu.

        Quando um pouco maior, ganhei um quadro para escrever.  Que alegria!  Eu repassava toda a matéria estudada no dia para meus alunos invisíveis... não sabia que assim agindo, eu estava reforçando o aprendido, e treinando para ser professora, anos mais tarde.

        O tempo foi passando, vieram os namorados, os presentes variavam de chocolate a perfume, uma blusinha aqui, uma sandália lá...

        Depois que casei, vieram os filhos.  Os primeiros presentes foram brinquedos, livros de pano, livros de banho e assim por diante.

        Lembro de três presentes, em especial pedidos por meu filho: num Natal, o ponte-car, uma camionete que tinha um mecanismo que fazia girar uma ponte que passava por cima de si mesmo e ia adiante, quando o carro daí passava por cima. Não tinha pilha que chegasse! Outro foi o pogobol, ou pula-pula.  Uma bola presa numa base, onde ele colocava os pés e pulava.  Ficava pulando o tempo inteiro, até criou músculos nas pernas de tanto pular... e o skate, no qual ele subia e andava.  Este fez com que, numa arte, caísse e quebrasse um dente da frente.

        Minha filha mais velha amava as bonecas, lembro da barbie face, que vinha uma cabeça e material de maquiagem.  Além do feijãozinho e outras bonecas lindinhas que ela tinha uma coleção. Outro presente que lembro bem que demos a ela foi um gravador colorido com microfone acoplado.  Cantar e fazer apresentações passou a ser sua diversão, gravando em fitas k7.

        A filha mais nova, já muitos anos depois, pois é temporã, também amava os bebezões, teve bonecas de todos os tamanhos, coleção de barbies.  Mas um ano ela encasquetou que queria um relógio com pulseiras coloridas.  Passou o ano inteiro buzinando nos meus ouvidos.  Como foi bem aprovada na escola, ganhou o tal relógio.

Porém o que eu mais gostava nos últimos natais em que minha família pôde reunir-se eram os que passávamos com meus pais, enquanto estavam vivos.  Reuníamo-nos na casa deles a minha família, as dos meus irmãos, irmãos do meu pai e da minha mãe e fazíamos uma festa maravilhosa todos juntos.  Morávamos no Paraná, meu irmão mais velho em Porto Alegre, mas sempre dávamos um jeito de estarmos juntos, pelo menos uma vez por ano.  Meu pai, meu marido e meu irmão ficavam encarregados do churrasco.  A mãe, eu e as cunhadas ficávamos encarregadas dos complementos e da sobremesa deliciosa; cada uma fazia uma diferente e servíamos depois da ceia.

        A comida era a desculpa.  Tinha jogo de dama, de xadrez, alguns assistiam ao Roberto Carlos na tv, as crianças corriam e brincavam.  Minha mãe colocava na eletrola seus elepês de natal, e eu sempre me emocionava. O pinheirinho era armado na sala todos os anos. Depois que ela aprendeu a tocar piano, fazia um pequeno concerto para nós.

        Depois da sobremesa, sempre aparecia o papai Noel que entregava os brinquedos para a criançada, mas os adultos também gostavam de receber as lembrancinhas.

        O natal sempre nos traz lembranças carinhosas das pessoas queridas que se foram.

        Agora, a matriarca sou eu.  A comemoração do aniversário de Jesus é na minha casa, com meus filhos e meus netos.

        A celebração continua, o amor permanece, algumas tradições são mantidas.  A família encolheu, mas o amor não. Além dos meus pais, meu marido também partiu.  Confraternizamos lembrando dos momentos de alegria passados com nossos queridos cujas cadeiras estão vazias.   Recordamos os muitos abraços, os beijos, as brincadeiras, a maravilha que era estar juntos.  Entretanto, há os descendentes para ocupar essas cadeiras e manter aquecidos os corações com amor, fé, carinho, fraternidade, esperança, muitas brincadeiras e correrias, para não perder o jeito.  Sempre tem alguém jogando damas ou cartas, um bebê chorando, alguém assistindo tv... e as músicas natalinas que eu amo e continuam me emocionando agora tocadas não na eletrola pelos elepês, mas baixadas da internet direto para computadores ou celulares.  As coisas mudam, mas as emoções não.

 

 

Lorení

Dezembro 2022.

       

Um comentário:

  1. Lindo texto. Muitas das tuas recordações são idênticas as minhas. Que saudades!

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