domingo, 6 de dezembro de 2015

A árvore e os frutos: cada um do seu jeito.







 

    Os 5 dedos da mão não são iguais: assim são os filhos.  Esta frase me foi dita uma vez pela minha sogra, em conversa familiar sobre filhos, educação, personalidades. E é uma verdade, sabedoria dos mais antigos.
Relembrando minha infância, tem o meu irmão mais velho, logo depois venho eu, o terceiro e o quarto.
Fisicamente não nos parecemos, quem nos olhasse, os quatro  juntos, sem saber que somos irmãos, não o diriam.  Só nossas arcadas dentárias são semelhantes.
Nossas personalidades também são muito diferentes. Embora tenhamos recebido, teoricamente, a mesma educação familiar, assumimos na vida caminhos diferentes.  Cada um do seu jeito.
Desde a infância, senti-me muito solitária por ser a única menina no meio dos guris.  E, século passado, meninos não brincavam com meninas...brincavam entre si e com os amigos.  Raras vezes curtimos brincadeiras juntos, quando eles deixavam-me participar.
Num dia de saudosismo, relembro infância e adolescência.
Quando tinha uns onze ou doze anos, situação financeira difícil da família, minha mãe, além de todo o serviço da casa, arrumou um extra: para uma litografia (na época assim  era chamada uma gráfica), fazíamos os fechamentos (colagem) de pacotinhos de sementes.  Pagavam pouco mais que nada, mas era um valor pago por cento; quanto mais colássemos, mais ganharíamos; desenvolvemos uma habilidade extrema neste trabalho manual, chegávamos a colar de 500 a mil por dia.  Toda a família - mãe e os três filhos mais velhos- nos envolvíamos nesta atividade para ajudar no orçamento.  Dizíamos "fazer saquinhos". Depois de terminadas as tarefas da escola, e da mãe concluir as atividades domésticas, dedicávamo-nos a isto.
Quando meu irmão mais velho foi estudar em Porto Alegre - chance só dada aos mais velho, os mais novos não a tiveram - continuamos a fazer esta atividade, agora destinando o resultado financeiro a  este irmão que fora em busca de novas oportunidades de estudos.
Quando éramos crianças, outra forma de aumentar a renda que minha mãe utilizou foi produzir seus deliciosos pastéis os quais meu irmão mais velho vendia nos jogos do Esporte Clube São Luís, de nossa cidade.  Para vendê-los, conseguia entrar de graça e, depois de vender os pastéis, assistia ao jogo ...
A mãe também costurava roupas de criança, e mandava-me oferecer nas casas vizinhas...meio envergonhada fui aprendendo, na prática, no rumo, sem orientação nenhuma, técnicas de venda... voltava com os troquinhos que ajudavam a família.
Meu irmão mais velho foi estudar na capital, aproveitar a oportunidade que o governo estava dando com as escolas técnicas.  Era o período da ditadura militar, e o país precisava de técnicos.  Inclusive este período, hoje, pode ser averbado à aposentadoria como tempo de serviço.  A ditadura militar não produziu só coisas ruins.
Todo o dinheiro extra que conseguíamos, mandávamos para ele. Sobreviver na capital não era fácil.
Quando estava no último ano do ginásio, além de fazer o curso de corte e costura que meu pai me obrigara - eu detestava estes trabalhos manuais - fiz o curso de datilografia, que era exigido para qualquer emprego que se procurasse no comércio ou indústria da cidade. Foi o que me deu o primeiro emprego, que me permitiu continuar estudando.
Enquanto isto, meus 3 irmãos só estudavam, sustentados pelo pai e pelos extras familiares.
Meu terceiro irmão também começou a trabalhar logo após terminar o ginásio.  Não era muito afeito aos estudos mas conseguiu cursar um pequeno período da graduação.
O mais novo era muito inteligente, porém tinha uma grave doença mental que atrapalhou sua vida; mesmo assim, conseguiu ser aprovado em vários vestibulares entre os primeiros colocados. Mas nunca conseguiu concluí-los.
O mais velho conseguiu concluir o curso superior depois de muitas dificuldades.
Somos os primeiros da família a concluir curso superior com o próprio esforço e sustento. Isto se chama mérito.  Infelizmente só depois da nossa luta de cidadãs e cidadãos a Constituição Federal de 1988 autorizou que fossem instituídos cursos superiores gratuitos em locais que não fossem grandes centros ou capitais.  Agora o acesso ao estudo está melhor. Por que lutamos, fizemos reuniões e assembléias durante a Constituinte, e enviamos nossas sugestões aos componentes do Congresso Nacional, que as aceitaram e incluíram na Constituição.  Participei de muitas destas reuniões, era professora na época.  É uma vitória do povo, do magistério e estudantes da época, década de 1980. Os que hoje têm acesso a estes estudos, que foram sendo implementados gradativamente, agradeçam a nós, à geração anterior que teve suas lutas e vitórias.  Do seu jeito.
Fisicamente também os filhos são diferentes.  Meu irmão mais velho é "rechonchudinho", assim como o mais novo era.  O terceiro é muito alto e magro, parecido com o pai.  Eu fiquei no meio-termo, nem magra nem gorda.  Mas o gene da obesidade anda se manifestando nos últimos tempos.
Quanto à personalidade e formas de encarar a vida, os quatro são totalmente diferentes e/ou antagônicos.
Meu irmão mais velho é calmo, até certo ponto.  Não mexam com ele.  Politicamente tende para o que se chama, no Brasil, esquerda. Honestíssimo, é uma pessoa que amo e admiro muito.
O terceiro tem o temperamento explosivo, e politicamente está na extrema direita.
O mais novo era um tanto impositivo, mas infelizmente fora prejudicado pela sua doença.  Politicamente era da direita, sem extremos.
Eu creio que ajo da forma que considero mais correta, dentro dos ditames da educação recebida e adquirida. Talvez um pouco impositiva, mas com diálogo.  Quando tenho que tomar decisões que envolvem outras pessoas ou a própria família, procuro argumentos e diálogos que sejam racionais.  Mas aprendi a ceder, quando necessário. (O nosso espelho interno sempre é mais benéfico...)   Politicamente, como já falei muitas vezes, sou conservadora.  Sem esquerda nem direita, sem  partido.  Pelo certo e justo, de acordo com meu entendimento.
Assim segue a vida...minha mãe às vezes se pergunta se a mistura deu certo...creio que deu.  Cada um do seu jeito, cidadãos de bem.



Numa destas aprendi datilografia e em muitas delas tirei                                                  meu sustento e da família.



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