sexta-feira, 16 de agosto de 2024

Mais leitura de peso: Saramago e suas palavras.

 

 


 

 Este livro encontrava-se em minha famosa pilha de livros a ler desde 2019.  Este é um daqueles livros que a gente lê sem pressa, degustando, como um vinho bom em ótima companhia.

De lá para cá, minha vida deu várias cambalhotas, que já comentei neste blog, e vou seguindo, passo a passo, dia após dia, com meu jeito de ser, aos trancos e barrancos,  com meus altos e baixos, como se diz no sul do Brasil.

Voltemos ao livro:

As palavras de Saramago, Organização e seleção de Fernando Gómez de Aguilera, é uma seleção de declarações ou publicações sobre Saramago retiradas de jornais, revistas, entrevistas, seus livros  e outras formas de pesquisa acerca do escritor tão admirado.

Vejamos o que diz o autor do livro, Aguilera:

"Dividida em três grandes seções centradas na pessoa, no escritor e no cidadão José Saramago, esta coletânea recolhe declarações suas extraídas de jornais, revistas e livros de entrevistas publicadas em diversos países ao longo de três décadas e meia.

Polêmico, provocador, combativo, o escritor sempre exerceu seu pensamento crítico sem censura, dizendo exatamente o que pensava.(...)"

E cita, ao final do Prefácio: "Tchekhov, que se recusou a trabalhar com heróis e não cessou em seu afã de dessacralizar a literatura e o ofício de escritor - traços compartilhados por Saramago -, afirmou: "A originalidade de um autor se apoia não só em seu estilo, mas também em sua maneira de pensar"".

Li com prazer este livro, obviamente não concordando com tudo o que ele dizia ou escrevia, mas, a maioria das vezes, batendo palmas.

Abaixo alguns excertos, para se ter uma ideia do livro, que tem 479 páginas.

"Somos muito mais a terra onde nascemos [e onde fomos criados] do que imaginamos."p.28

"Penso saber que o amor não tem nada que ver com a idade, como acontece com qualquer outro sentimento. (...) O que acontece é que há  toda uma história nem sempre feliz do amor que faz que seja entendido que o amor numa certa idade seja natural, e que noutra idade extrema poderia ser ridículo. Isso é uma ideia que ofende a disponibilidade de entrega de uma pessoa a outra, que é em que consiste o amor. (...)

Aprendi que o sentimento do amor não é mais nem menos forte conforme as idades, o amor é uma possibilidade de uma vida inteira, e se acontece, há que recebê-lo.(...)" p.35.

"O único valor que considero revolucionário é a bondade, que é a única coisa que conta." p.37.

"A vida, que parece uma linha reta, não o é. Construímos somente uns cinco por cento da nossa vida, o resto fazem os outros, porque vivemos com os outros e às vezes contra os outros. Mas essa pequena porcentagem, esses cinco por cento, é o resultado da sinceridade consigo mesmo."p. 41

Não gosto de falar de felicidade, mas de harmonia: viver em harmonia com nossa consciência, com nosso entorno, com a pessoa que queremos bem, com os amigos.  A harmonia é compatível com a indignação e a luta; a felicidade é egoísta."p.41

"Nunca caí em excesso de manifestações de alegria e júbilo.  Tenho sempre um pé atrás, e não é por prudência como quem se defende, é porque eu conheço suficientemente bem a história dos meus semelhantes para saber que nada é definitivo e que o motivo de riso de hoje pode amanhã tornar-se em lágrimas."p.63

"Nossa única defesa contra a morte é o amor". p.172

"Se a morte desaparecesse de repente,  se a morte deixasse de matar, muita gente entraria em pânico: funerárias, seguradoras, asilos de velhos... Isso sem falar do Estado, que não saberia como pagar as aposentadorias.". p.173

"No ato de escrever coincidem duas posturas, a autoridade e a sedução.  Com essas duas pernas a literatura caminha.  O escritor tem um poder sobre o leitor". p.200

"No fundo, todos temos necessidade de dizer quem somos e o que é que estamos fazendo, e a necessidade de deixar algo feito, porque esta vida não é eterna e deixar coisas feitas pode ser uma forma de eternidade."p.203 

"Gostaria de não interromper nunca a minha escrita, nem com sinais de pontuação nem com capítulos, que tudo fosse simultâneo, o mesmo que ocorre com a realidade: o carro que passa, o fotógrafo que faz uma foto, o vento que mexe com os galhos.  Quando eu digo que preciso de "ouvir" minha escrita, me refiro a que preciso que a escrita saia com essa fluidez que empregamos quando falamos.  Preciso escutar uma voz interna, essa mesma voz que o leitor também tem que aprender a escutar, para penetrar nos meus textos." p.239.

Muito mais há em todas as páginas.

Saramago mexe com a gente.

Vou deixar a sugestão de leitura para complementação das ideias do político e do escritor.

Vale totalmente a leitura!

 

SARAMAGO, José. As palavras de Saramago: catálogo de reflexões pessoais, literárias e políticas/ Fernando Gómez Aguilera - São Paulo: Cia. das Letras, 2010,479p.


 

 

 


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